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26 outubro 2009

da classe
dominante brasileira


HÁ DUAS SEMANAS, as elites dominantes brasileiras usaram todo seu arsenal a disposição: rádios, redes de televisão, jornais impressos, colunistas de plantão, jornalistas pré-pagos, parlamentares oportunistas, ruralistas e até autoridades judiciais para denunciar um vandalismo sem precedentes: a destruição de mil pés de laranjas por militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Isso era inconcebível. “Queremos punição!” Bradavam, exigindo nova Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para criminalizar o MST e todos os que lutam por mudanças neste país. Afinal, nada melhor do que manter o mundo perfeito em que vivemos; não precisa mudar nada e muito menos lutar por mudanças.
Alguns mais afoitos chegaram a concluir: é o fi m do MST. Outros, com verso e prosa declaravam o fim dos movimentos sociais e da reforma agrária. E num só coro, todos clamavam: basta de vandalismo, desses pobres diabos do campo!
Mas a realidade brasileira e a luta de classes é bem mais dura do que seus confortáveis apartamentos e seus diferenciados rendimentos, pagos pelas empresas de comunicação (ou pelo povo?).
Independente das pacatas laranjas e das manipulações da Cutrale/Coca-Cola, detentora de 50 mil hectares distribuídos por mais de 30 fazendas, as duas semanas que se seguiram deram uma demonstração cruel do vandalismo estrutural e ideológico que domina as mentes e a política da classe dominante. Vamos recordar apenas alguns fatos, já que a memória tão curta da grande imprensa os calou:
1. Um incêndio mal explicado numa favela da região oeste de São Paulo deixou centenas de famílias sem absolutamente nada. Ninguém procura explicar porque, em pleno século 21, famílias de trabalhadores ficam expostas a essas condições de vida e riscos absurdos, na maior e mais rica cidade do hemisfério sul;
2. Enchentes e temporais transformam pacatas cidades do interior e grandes metrópoles em verdadeiros infernos. Mas ninguém explica para a população a causa das mudanças climáticas e das “vinganças” da natureza;
3. Oitenta e três trabalhadores da construção civil foram resgatados pela Polícia Federal, pois estavam trabalhando “em condições análogas à escravidão”. Sabe onde? Nada menos do que numa hidrelétrica, na região dos Parecis (MT). Logo as hidrelétricas, que representam tanto progresso;
4. Fazendeiros armados atacam um acampamento dos povos indígenas Kaiowa-guaranis, na região de Dourados (MS), colocam fogo em seus barracos e pertences e os expulsam. Os indígenas perderam tudo, menos a dignidade. Não houve mortes, milagrosamente, porque realizaram a ação à luz do dia, certos da impunidade. Detalhe: as terras da fazenda são dos povos indígenas. Quem é o verdadeiro invasor?;
5. Não bastassem os fatos do Brasil rural, eis que a violência social emerge sem controle nas cidades. Num final de semana no Rio de Janeiro, um helicóptero derrubado, dezenas de mortos, entre moradores, traficantes e policiais. Oito ônibus incendiados. A notícia poderia ser algum distante cenário de guerra, mas não, é na “cidade maravilhosa”. Muitos bairros do Rio vivem em guerra entre traficantes, polícia e milícias armadas e alimentadas pela classe dominante;
6. E a enfermidade social desse vandalismo estrutural, praticado pelas elites, aparece também nas atitudes pessoais de uma classe disposta a tudo para proteger seu patrimônio material. O irmão de um ex-governador de São Paulo, da “fi na flor” paulistana, assassina o próprio fi lho, por causa do mau uso do seu automóvel, e depois se suicida. Triste pobreza ética;
7. O capitalismo propagandeado pela imprensa é o melhor dos mundos. Na agricultura seria um sucesso, com suas empresas e seus venenos. Ledo engano. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) acaba de anunciar que neste mês a humanidade atingiu a marca de 1 bilhão de seres humanos que passam fome todos os dias. É mais do que vandalismo dos que controlam os estoques de comida, já que a produção existente é suficiente. É um verdadeiro genocídio acobertado pelas elites e por seus meios de comunicação.Como se vê, os fatos nos remetem a uma boa reflexão sobre os vandalismos praticados todos os dias pela classe dominante. Isso nos ajuda a pensar sobre quem

09 outubro 2009

A literatura e o jogo de pregos do Xisto Veneroso

Carlos Lúcio Gontijo


Em meu primeiro livro, fiz questão de me anunciar não como poeta ou escritor, mas tão-somente como sensibilista. O tempo passou e mais sensível diante do mundo em me fiz, enchendo-me de certeza que minha literatura não passa de soma e relato de memórias que se enraizaram física e espiritualmente dentro de mim. Às vezes me pego saudoso até de meus passos que ficaram incrustados no tempo, guardando as marcas de minha caminhada vida afora e contendo o peso de minhas esperanças e desesperanças como ser humano perante um planeta Terra cheio de senhores e sinhazinhas, que ainda vivem e se comportam como se a sociedade estivesse sob a égide histórica da casa grande e senzala.
Toda a minha literatura é fruto colhido em minha convivência com as pessoas que me rodeavam ou que me rodeiam, mas que independentemente do tempo me habitam como se eu fosse um lugarejo em carne, ossos e alma. São muitas as pessoas que me ajudaram a moldar a minha visão de mundo, auxiliando-me na formação de conceitos e impregnando-me da crença absoluta na prática do amor ao próximo como a maneira mais fácil de orar e agradar a Deus. Ou seja, somos o terço um do outro e, fora desse prisma, o que temos é a fé pobre de atos, gestos e ação.
Lembro-me constantemente de minha infância em Santo Antônio do Monte, quando aos nove anos escrevia os primeiros poemas e os escondia debaixo do colchão. Minha mãe foi a primeira a descobri-los e, também, a dar apoio para que o desenvolvimento do dom da poesia não se perdesse no emaranhado rude de uma sociedade que confunde a opção pela realidade como sinônimo de desapreço por estrela, pôr-do-sol, pés no riacho...
Naqueles bons tempos de menino em minha Santo Antônio do Monte, era parte dos meus sonhos simples de consumo sentar-me no bar do Xisto Veneroso – o Sô Xisto, que ensinou o meu pai José Carlos Gontijo a dirigir – para tomar refrigerante, chupar picolé, sorvete. Eu e os demais amigos gostávamos de disputar campeonatos de futebol numa tábua, na qual se desenhava um campo e se fixavam pregos como se fossem jogadores. Uma moeda (pratinha era o nome que lhe dávamos) fazia a vez de bola, que recebia uma tacada feita com o dedo, alternadamente, pelos contendores. Sô Xisto foi quem engendrou a melhor tábua de jogo e deu ao filho Oswaldo, que nos permitia usufruir do disputado brinquedo.
E eis que estava certa feita no bar do Xisto tomando refrigerante com sorvete, enquanto caía uma chuva fina que, aos poucos, foi diminuindo até parar de vez. Ao sair, como já não chovia, acabei me esquecendo do guarda-chuva e, no dia seguinte, dirigi-me até o bar a fim de recuperá-lo. Sô Xisto, gentil e educadamente, pôs-se a procurar pelo guarda-chuva, mas chegou à conclusão de que alguém o havia levado. Chateado com o sumiço, apesar de não ter culpa alguma pelo ocorrido, me disse: “Olha, Lúcio, não tenho como lhe devolver o guarda-chuva! Mas que tal você ficar com o jogo de preguinho como compensação? Não pensei duas vezes e aceitei a proposta.
Disputei muitas partidas no especial brinquedo. Casei-me, vieram os filhos e com eles muitas vezes revivi a minha época de criança em Santo Antônio do Monte, cidade em que esqueci (ou perdi) os meus passos de menino e que, repetindo o gesto do Sô Xisto, não me podendo devolvêosme podendo devolvdo seu Xistopassos de menino e que vocuir do disputado bringuedo.
mpo habitaminda dividem peso de minha-los d -los, premiou-me com o alicerce de alma e sensibilidade que norteia a minha literatura, ensinando-me que “História verdadeira cheira a berço”, como um dia grafei num dos versos do poema “O ser poetizado”.
Carlos Lúcio Gontijo
Poeta, escritor e jornalista
www.carlosluciogontijo.jor.br




uso

02 outubro 2009

Dia do Professor, 15 de outubro

Carlos Lúcio Gontijo


A lamentável situação do ensino brasileiro, onde as crianças completam, em média, apenas quatro anos na escola, é responsável pelo baixo poder de mobilização da sociedade constantemente tripudiada e dirigida por uma elite que vai da empresarial, política, intelectual e religiosa até à indisfarçável elite sindical.
Não é preciso ser nenhum especialista em educação para observarmos que o planejamento estrutural do ensino brasileiro, principalmente o fundamental, se encontra pedagogicamente montado para atender 20% de sua clientela, uma vez que sua linguagem está voltada para os usos e costumes das camadas mais abastadas ou menos desafortunadas da população, o que explica o fato de muitos alunos abandonarem os estudos antes de completar o quarto ano. Ou seja, a própria formatação didática contribui para a ampliação da evasão escolar.
Os temas educação e saúde são tratados como prioritários apenas nos períodos eleitorais, quando os políticos, do alto de seus palanques, buscam a conquista dos votos necessários para alcançar o sonhado mandato, por meio do qual ao invés de se tornarem representantes do povo passam a ser representantes de si mesmos e dos grupos financiadores de suas campanhas.
A bem da verdade o governo brasileiro ainda se nos apresenta bastante distante de exercitar o investimento pleno em educação e saúde, que são setores onerosos e de resultados a longo prazo, que costumam ser colhidos a pelo menos uma geração depois de aplicados, ao passo que a eleição está sempre tão próxima. Não é à toa portanto que o Brasil, em matéria de educação, esteja ao lado da Indonésia, Paquistão e Bangladesh, situando-se assim entre os dez países que, juntos, arcam com 73% dos analfabetos de todo o Planeta. Por desestímulo, pobreza, distância da escola ou necessidade de trabalhar para ajudar no sustento da família, um número significativo de alunos deixam os estudos constantemente.
Diante de um quadro em que a administração pública não prioriza a educação, é lógico que os professores padeçam a saga do descaso e dos baixos salários. Em Minas Gerais , por exemplo, uma bibliotecária do ensino fundamental, mesmo com o propalado incentivo à leitura apregoado pelo governo do Estado, já em final de carreira, preste a se aposentar, com todos os quinquênios e penduricalhos possíveis, não ganha mais que 600 reais.
Indubitavelmente, ao constatarmos o nosso estágio educacional, somos tomados pela certeza de que as nossas autoridades constituídas seguem, com renitência e devoção, o famoso conselho de Lao-Tsé, filósofo chinês nascido na China ( 604 a .C), que recomendava aos governantes: “Enfraquecei os espíritos e fortificai os ossos”. Ou mais claramente: educar o povo é arruinar o Estado, colocar em perigo o poder totalitário – democraticamente legitimado pelas urnas e dependente da ignorância dos cidadãos, que subjugadas culturalmente não conseguem exercer em plenitude a sua cidadania.
Dessa forma – numa homenagem ao Dia dos Professores –, conscientes de que jamais seríamos o “escriba” (ainda que menor) que somos sem o apoio dos mestres que passaram por nossa vida estudantil, enviamos muitos livros de nossa autoria, em espontânea doação, às 18 bibliotecas conveniadas à Associação dos Amigos das Bibliotecas Comunitárias da Região Metropolitana de Belo Horizonte (SABIC), à Borrachalioteca (criação do jovem amigo Marcos Túlio Damascena, em Sabará/MG), além de passar exemplares ao idealista projeto “Livros ao Pé da Árvore”, sob o comando do sensível advogado e escritor João Silva de Souza, que esporadicamente sai, aos domingos e feriados, deixando obras literárias pelas praças da capital mineira afora, sob a esperança de que elas façam germinar, na mente das pessoas que as “pegarem”, a esperada flor primaveril sonhada por todos os bons professores e defensores da educação: o supremo e indispensável gosto pela leitura.
Carlos Lúcio Gontijo
Poeta, escritor e jornalista
www.carlosluciogontijo.jor.br