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20 fevereiro 2009

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Abram alas para a Campanha da Fraternidade

· Carlos Lúcio Gontijo

Muitas vezes, no Brasil, a gente sente que não tem mesmo com quem contar. Ainda agora, quando preparo a edição de dois novos livros, observo que tudo continua difícil e quase intransponível no meio cultural. Se tomarmos como verdadeira a sentença de Rui Barbosa que nos diz que “justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta”, temos diante de nós um Poder Judiciário que, além de moroso e lento, contribui decisivamente para a clara percepção de impunidade e consequente eclosão do ovo da serpente da violência generalizada, prejudicando a disseminação do indispensável amor ao próximo apregoado por Jesus Cristo.
Não é mais possível aceitar a tese de que, apesar do péssimo serviço final prestado à população, existam bons homens públicos que, inocentes e involuntariamente, se veem obrigados a estar tão próximos do produto malcheiroso (e correndo a céu aberto) apresentado pelo Poder Legislativo, ao qual o Poder Executivo tem que afagar com mil e uma benesses em nome da governabilidade. É impossível admitir-se a existência de detentores de mandato popular incapazes de se exporem e, deixando de lado o corporativismo, nomear os pares que maculam os trabalhos políticos.
Nada mais intolerável que solicitar à população ou aos meios de comunicação a citação de nomes, quando o próprio produto da classe política denigre a imagem do Congresso e coloca em xeque a sua cara e perdulária existência, uma vez que o Poder Executivo se vê cada vez mais tangido a lançar mão do instrumento da medida provisória, porque não pode esperar, indefinidamente, pelo germinar de idéias e votação de leis oriundas de um núcleo parlamentar que se engalfinha para, ao final do entrevero, eleger lideranças ultrapassadas; velhas e articuladas raposas banhadas no mais obscuro fisiologismo, mas que, descaradamente, ousam se nos apresentar como baluartes do clamor do povo por mudança e renovação.
Voltando a outra assertiva/aforismo de Rui Barbosa, temos que “povo cuja fé se petrificou, é um povo cuja liberdade se perdeu”. A realidade é que assistimos hoje ao avanço de uma sociedade brasileira que cresce economicamente na informalidade, efetivando o desejo político, ideológico e psicológico de se distanciar do mundo burocrático, cartorial e tributário alicerçado por um governo onde a classe política se vê como uma espécie de poder exponencial e concedente da democracia. Ou seja, o regime democrático tem, segundo a opinião dos nobres parlamentares (vereadores também), no Poder Legislativo a razão maior de sua manutenção, esquecendo-se eles de que democracia sem povo é sempre sinônimo de ditadura, pois a unção das urnas não legitima comportamento e atos administrativos totalitários.
A Campanha da Fraternidade lançada pela Igreja Católica este ano tem como título “Fraternidade e Segurança Pública”, sob o lema “A Paz é fruto da Justiça”. A iniciativa vem em momento oportuno, pois evolui o discernimento de que o Estado é agente propagador de violência a partir da lição cotidiana de que uma vida não vale nada: é cidadão morrendo sem atendimento médico na porta de hospitais públicos; é criança e jovem sem lar, sem escola nem oportunidade de trabalho; é a adoção de métodos que retiram elevadas porcentagens dos parcos ganhos percebidos pelos aposentados e pensionistas; é a guerra civil branca encharcando de sangue as ruas do País; é a clara opção dos meios de comunicação pela exaltação ao supérfluo, imoral e desprovido de valor cultural (depois indagam sobre o porquê de tantas crianças e adolescentes grávidas).
Num ambiente assim conflituoso, no qual não há lugar para a prática cristã e humana do fraterno amor ao próximo, todas as relações sociais são progressivamente corroídas e comprometidas. Vejam, por exemplo, o caso do equilíbrio de forças entre o capital e o trabalho. Como explicar que, logo de início, sem qualquer análise mais profunda sobre a crise econômica mundial originária da ganância de gestores financeiros norte-americanos, os trabalhadores brasileiros se deparassem, imediatamente, com o fantasma do desemprego. Foi bastante desalentador vislumbrar tantas lideranças empresariais desejosas em se utilizarem da crise econômica para precarizar (o eufemismo é flexibilizar) as relações de trabalho, a começar pela diminuição de salários, em conformidade com as necessidades do patrão.
Confesso-lhes que não deu para entender tal postura, pois os salários da classe trabalhadora brasileira são reconhecidamente baixos, com raríssimas exceções. Recente pesquisa com aparentes e supostos moradores de rua na Gávea, no Rio de Janeiro, revelou-nos um dado avassalador: mais da metade dos que ali dormiam sob as marquises possuem carteira assinada e família, à qual visitam apenas nos fins de semana, pois não recebem o suficiente para ir em casa e voltar para o trabalho todos os dias. Então, caro leitor, deixo-lhe uma pergunta: onde estão a honestidade e a fraternidade? E, na certeza do silêncio da falta de resposta, recorro a uma oração contrita: Bom é louvar-vos, Senhor, nosso Deus, que nos abrigais à sombra de vossas asas, defendeis e protegeis a todos nós, vossa família, como uma mãe, que cuida e guarda seus filhos. Nesse tempo em que nos chamais à conversão, à esmola, ao jejum, à oração e à penitência, pedimos perdão pela violência e pelo ódio que geram medo e insegurança. Senhor, que a vossa graça venha até nós e transforme nosso coração. Abençoai a vossa Igreja e o vosso povo, para que a Campanha da Fraternidade seja um forte instrumento de conversão. Sejam criadas as condições necessárias para que todos vivamos em segurança, na paz e na justiça que desejais. Amém.
Carlos Lúcio Gontijo
www.carlosluciogontijo.jor.br

09 fevereiro 2009

Cada qual no seu castelo

* Carlos Lúcio Gontijo

Enquanto o povo, como nos diz a canção de sucesso e baixo valor musical, permanece cada qual no seu quadrado – que tanto pode ser um barraco três por quatro, uma cova no cemitério ou uma cela, onde a violência e a desigualdade social costumam jogar os cidadãos menos favorecidos –, os abastados festejam sua riqueza nababesca em seus castelos.
O castelo Monalisa, pertencente à família do deputado mineiro Edmar Moreira, agora ex-corregedor da Câmara, é obra construída, entre os anos de 1982 e 1990, nas fraldas cada vez mais insalubres das montanhas de Minas Gerais, que, desde o Ciclo do Ouro, convive com a poluição e o desmatamento provocados pelas atividades de mineração. Ou seja, o castelo provinciano e sem serventia aparente era do conhecimento de todos os que circulam nas hostes políticas.
Estado mediterrâneo e síntese do Brasil, aqui, nas Gerais, não poderíamos ter paisagem social diferente daquela a que assistimos no restante do País. Aliás, o povo mineiro está tão acostumado com a suntuosidade de suas elites que o tal castelo sequer era motivo de admiração, revolta ou esconjuro da vizinhança, que só teve sua atenção chamada após a divulgação de sua existência pela imprensa nacional, mais exatamente de São Paulo, que, pelo visto, está à caça de políticos mineiros com algum desvio de conduta, com o objetivo de enfraquecer a intenção de o governador Aécio Neves sair candidato à Presidência da República pelo PSDB, notoriamente um partido sob o domínio da paulicéia desvairada.
Mais uma vez, um meio de comunicação do eixo Rio-São Paulo, como aconteceu no caso do escândalo do mensalão, que eclodiu nos teares do silêncio mineiro, nos revela mais um desmando, em que um deputado eleito pelo DEM-MG – sigla partidária na qual se abrigam os integrantes do mesmo PFL de antigamente e que, para não perder a face de seu passado, se nos apresenta liderado, na Câmara, pelo ruralista Ronaldo Caiado – , além de ser proprietário de castelo não declarado ao Fisco e à Justiça Eleitoral, deve cerca de 45 milhões ao INSS – um fato mais ou menos comum no meio empresarial brasileiro e, certamente, responsável pelos propalados déficits previdenciários.
Logicamente, para cada castelo que, casualmente, desmorona, outros são erguidos. Não importa o desfecho do caso do deputado do castelo sem reino, pois ao final das contas impera o velho chavão do sabe com quem está falando, freqüentemente repetido por gente graúda pega no contrapé da ilegalidade, da contravenção ou do crime. Na maioria das vezes, os castelos que permeiam as relações sociais não são materializados ou estão à vista como o castelo incrustado em solo mineiro, pois se encontram na simples manifestação de força e poder.
Não faz muito tempo (dia 16 de janeiro), na terra que tem como um de seus expoentes artísticos o cantor e compositor Milton Nascimento, a secretária do vice-governador de Minas Gerais, Marcela Amorim Brant, filha do ex-deputado federal Roberto Brant, foi abordada pelo segurança Antônio Carlos de Lima, funcionário de uma loja na região da Savassi, que lhe solicitou, no cumprimento de sua função, que não estacionasse seu veículo em local proibido, de uso exclusivo da loja. Inesperada e surpreendentemente, recebeu como resposta diversas ofensas e impropérios, em clara prática de preconceito racial.
O imbróglio se transformou em caso de policia. A PM mineira compareceu ao local colhendo depoimentos e o testemunho de quem havia presenciado o fato, encaminhando a secretária do vice-governador e o segurança para a delegacia. Todavia, a secretária resolveu estampar seus ares encastelados e logo os policiais que lavravam a ocorrência passaram a ser pressionados para “aliviar” o boletim de ocorrência sobre o inafiançável crime de racismo. O que ocorreria a seguir vem comprovar que os encastelados no governo se acham acima da lei e são bastante espertos para jamais atirar suas tranças... A notícia saiu no Novojornal – e só! Não teve repercussão, afinal os que habitam castelos raramente são alcançados pelo rigor da lei e, quando o são, não ficam presos ou recebem branda condenação. Então, não sejamos hipócritas e aproveitemos o caso do castelo Monalisa para vislumbrar os inúmeros castelos que nos rodeiam e aos quais a estapafúrdia e megalomaníaca obra do deputado não pode servir de sombra ou escudo protetor.
Carlos Lúcio Gontijo
www.carlosluciogontijo.jor.br

02 fevereiro 2009

A ruína da Las Vegas global

· Carlos Lúcio Gontijo


Não é fácil exercer a atividade de articulista nos meios de comunicação brasileiros, pois, para isso, é preciso, além de sua exposição atender aos interesses editoriais da empresa, sua integração a uma inconfessável igrejinha jornalística (parecida com as que existem no campo literário), onde você tem que fingir – alguns acreditam piamente – que faz parte de um grupo seleto de intelectuais formadores de opinião, que interfere ou auxilia a população na propalada e difícil tomada de decisões.
Contudo, na realidade e maioria das vezes, os laureados escribas estão a serviço do corporativismo praticado pelas várias facções ideológicas que detêm o poder e o comando de estruturas alicerçadas em aparente democracia, para assim, por intermédio da unção das urnas do voto obrigatório, melhor imporem sua vontade de cunho ditatorial.
A economia, que hoje mundialmente desanda, encontrou à sua disposição espaço privilegiado nas colunas e editoriais dos meios de comunicação, que foram incapazes de detectar o mau cheiro que exalava das mãos e mentes dos gestores da área financeira, que chafurdavam em ganância e irresponsabilidade social sem limite, como se o mundo fosse uma grande Las Vegas à disposição de sua vocação para o vício da jogatina financeira.
Lamentavelmente, nós – a sociedade – somos inocentes úteis que servem de massa de manobra ao senhorio dos mercados de capital, dos banqueiros e dos políticos, que só dividem com o povo o prejuízo e a derrocada, extraindo para si próprios todo o benefício possível e imaginável nos tempos de bonança. Não há, por tudo isso, qualquer esperança de que ressurja, da crise de crédito por que passa a economia globalizada engendrada pelo neoliberalismo, uma leva de políticos e gestores financeiros mais responsáveis, pois, com toda a certeza, os mecanismos da obsessão pelo ganho fácil serão revitalizados assim que a poeira baixar.
Da mesma forma que assistimos aos banqueiros recorrendo aos cofres públicos para se safar dos resultados advindos de sua administração financeira temerária, os políticos que, no caso brasileiro, fazem do Legislativo um poder inócuo, perdulário e desprovido de mobilização cívica, mesmo em momento de crise como o que ora experimentamos, caem no equívoco de justificar a sua existência na pregação simplista de que, sem ele, não existe democracia.
Todavia, ao se comportar dessa forma, a classe política termina por semear ideias arbitrárias e golpistas e, depois, quando elas se materializam, as lideranças políticas, feito os banqueiros que agora recorrem aos cofres públicos, convocam o povo (a desprezada terceira pessoa, o outro, pois ninguém se sente povo) para lutar pela redemocratização do país.
Dirão alguns que estamos generalizando, porém o nosso desejo é este mesmo. Quando reclamamos, por exemplo, que determinado órgão de imprensa é ruim, não somos obrigados a apontar o nome dos jornalistas responsáveis pelo produto final que chega ao público leitor, ao telespectador, ao ouvinte. Ou seja, como dizia minha mãe Betty, uma mato-grossense que sabia das coisas, ao dono da boiada compete a denominação dos bois. Cabe, enfim, aos políticos que se nos apresentam como honrados e probos o ônus e o desgaste de apontar os pares que desonram a sua classe e a conduzem à má prestação de serviços à população.
Ademais, agremiação partidária que se preze deveria manter em seus quadros apenas políticos merecedores do voto do eleitor, que não pode, de forma alguma, ser responsável pela depuração, ou melhor, pela extração de bom candidato em meio ao lixo que lhe é apresentado como digno de sufrágio.
Em síntese, o que de mais explícito brilha nos horizontes da crise é que, apesar da arrogância, idiossincrasias, caras, bocas e beicinhos encenados por âncoras televisivos contrariados (além de tantos editoriais e artigos embebidos em erudição e pretensa sabedoria publicados por economistas, políticos, jornalistas etc.), ninguém vislumbrou antecipadamente a crise econômica que nos assola, demonstrando que, no âmbito da economia, não é preciso frequentar os cassinos para se fazer parte do jogo – principalmente quando os graúdos e festejados endinheirados perdem. A conclusão inconteste é que, até quando os donos do capital não têm sorte, o azar é nosso.
Carlos Lúcio Gontijo
www.carlosluciogontijo.jor.br