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02 fevereiro 2009

A ruína da Las Vegas global

· Carlos Lúcio Gontijo


Não é fácil exercer a atividade de articulista nos meios de comunicação brasileiros, pois, para isso, é preciso, além de sua exposição atender aos interesses editoriais da empresa, sua integração a uma inconfessável igrejinha jornalística (parecida com as que existem no campo literário), onde você tem que fingir – alguns acreditam piamente – que faz parte de um grupo seleto de intelectuais formadores de opinião, que interfere ou auxilia a população na propalada e difícil tomada de decisões.
Contudo, na realidade e maioria das vezes, os laureados escribas estão a serviço do corporativismo praticado pelas várias facções ideológicas que detêm o poder e o comando de estruturas alicerçadas em aparente democracia, para assim, por intermédio da unção das urnas do voto obrigatório, melhor imporem sua vontade de cunho ditatorial.
A economia, que hoje mundialmente desanda, encontrou à sua disposição espaço privilegiado nas colunas e editoriais dos meios de comunicação, que foram incapazes de detectar o mau cheiro que exalava das mãos e mentes dos gestores da área financeira, que chafurdavam em ganância e irresponsabilidade social sem limite, como se o mundo fosse uma grande Las Vegas à disposição de sua vocação para o vício da jogatina financeira.
Lamentavelmente, nós – a sociedade – somos inocentes úteis que servem de massa de manobra ao senhorio dos mercados de capital, dos banqueiros e dos políticos, que só dividem com o povo o prejuízo e a derrocada, extraindo para si próprios todo o benefício possível e imaginável nos tempos de bonança. Não há, por tudo isso, qualquer esperança de que ressurja, da crise de crédito por que passa a economia globalizada engendrada pelo neoliberalismo, uma leva de políticos e gestores financeiros mais responsáveis, pois, com toda a certeza, os mecanismos da obsessão pelo ganho fácil serão revitalizados assim que a poeira baixar.
Da mesma forma que assistimos aos banqueiros recorrendo aos cofres públicos para se safar dos resultados advindos de sua administração financeira temerária, os políticos que, no caso brasileiro, fazem do Legislativo um poder inócuo, perdulário e desprovido de mobilização cívica, mesmo em momento de crise como o que ora experimentamos, caem no equívoco de justificar a sua existência na pregação simplista de que, sem ele, não existe democracia.
Todavia, ao se comportar dessa forma, a classe política termina por semear ideias arbitrárias e golpistas e, depois, quando elas se materializam, as lideranças políticas, feito os banqueiros que agora recorrem aos cofres públicos, convocam o povo (a desprezada terceira pessoa, o outro, pois ninguém se sente povo) para lutar pela redemocratização do país.
Dirão alguns que estamos generalizando, porém o nosso desejo é este mesmo. Quando reclamamos, por exemplo, que determinado órgão de imprensa é ruim, não somos obrigados a apontar o nome dos jornalistas responsáveis pelo produto final que chega ao público leitor, ao telespectador, ao ouvinte. Ou seja, como dizia minha mãe Betty, uma mato-grossense que sabia das coisas, ao dono da boiada compete a denominação dos bois. Cabe, enfim, aos políticos que se nos apresentam como honrados e probos o ônus e o desgaste de apontar os pares que desonram a sua classe e a conduzem à má prestação de serviços à população.
Ademais, agremiação partidária que se preze deveria manter em seus quadros apenas políticos merecedores do voto do eleitor, que não pode, de forma alguma, ser responsável pela depuração, ou melhor, pela extração de bom candidato em meio ao lixo que lhe é apresentado como digno de sufrágio.
Em síntese, o que de mais explícito brilha nos horizontes da crise é que, apesar da arrogância, idiossincrasias, caras, bocas e beicinhos encenados por âncoras televisivos contrariados (além de tantos editoriais e artigos embebidos em erudição e pretensa sabedoria publicados por economistas, políticos, jornalistas etc.), ninguém vislumbrou antecipadamente a crise econômica que nos assola, demonstrando que, no âmbito da economia, não é preciso frequentar os cassinos para se fazer parte do jogo – principalmente quando os graúdos e festejados endinheirados perdem. A conclusão inconteste é que, até quando os donos do capital não têm sorte, o azar é nosso.
Carlos Lúcio Gontijo
www.carlosluciogontijo.jor.br

2 comentários:

Anônimo disse...

Pois é meu caro Carlos Lúcio, sou apreciador das suas ideias, e sei da sua competência. Mas agora você arrazou! Acertou bem na mosca atual. Na minha igenuidade total, só me resta lamentar: quietinho no meu canto, e mesmo assim sou responsável pela crise financeira internacional. E eu não tenho um vintém furado. Pode uma coisa dessa?

ELAINE BUENO disse...

Querido Carlos Lúcio:
Estou maravilhada com sua colocação economicamente realística da situação sócio-política atual, que está, abruptamente, a empobrecer não só nossos bolsos, como também nosso cabedal intelecto, através do manuseio egocentrico dos meios de comunicação.
Parabéns, mais uma vez, amigo!
Sempre que tenho oportunidade de ler você, sou invadida por uma grande alegria interior, pois relembro o que profetizou, em 80, o poeta mineiro Bueno de Rivera, ao se referir à sua pessoa: “ Esse rapaz vai longe... Tem apurada sensibilidade poética, rara nos dias de hoje! ” Meu tio era homem de sábias palavras! Abraço lírico.